terça-feira, 8 de setembro de 2009

Da janela para o mundo

Amor de Feira

-Olha o acarajé!
-tapioca, carne seca!
-Pastel de queijo, de camarão.

Começo de feira. Tudo fresco. Cheiro de terra. Alfazema, canela, rosas, perfume de camelô! Ah, olha só quem vem passando! Não costumo dizer estas coisas, mas é a bela Jasmim, seu nome realmente combina, porém, seus cabelos tem cheiro de cravo. Não gosto muito de jasmim, prefiro orquídeas, mas Jasmim me encantou. Sempre a vejo na barraca de flores. Ela sempre leva duas dúzias de rosas vermelhas.

O que será ela fazer com tantas rosas. Acho que ela vai visitar o túmulo de algum parente querido que se foi. Deve ter sido muito triste para ela, imagino como é perder um ente querido. Quando perdi minha avó meu mundo ruiu. Imagino que ela precise de apoio. Eu poderia comprar algumas rosas para lhe dar.

Vou andando, esta hora ela já deve estar na barraca. Vou andar lentamente, fingindo que passeio sem um propósito claro e paro na barraca falando do dia. Não! Mas o que estou fazendo? As mulheres gostam de homens decididos, então eu devo andar depressa e mostrar que a barraca de flores já era um destino certo e objetivo. Pera ai, como vou saber se Jasmim é movida pelo apego ao acaso ou pelo desejo da segurança e propriedade de um homem maduro!

Muita gente na feira. A multidão se esbarra. Estou preso a passos muito lentos. Me sinto impotente. Preciso chegar a barraca de flores. Cada passo que dou parecem ter o intervalo de horas. Tudo que consigo pensar é chegar a barraca. Sinto cheiro de goiabada cascão, estou muito longe da barraca de flores. Não consigo pensar como sair daqui. Vou perder de falar com Jasmim. Vim muitas vezes a feira, mas somente hoje tomei coragem de falar com ela. Temo a semana que vem não ter mais coragem de tal ato de romantismo. Ou talvez estar desiludido com o amor humano. Preciso chegar lá hoje mesmo.

Um senhor ao meu lado vende jogos de loteria. Vou comprar um jogo. Pode ser um bom álibi para mim estabelecer diálogo com Jasmim. Talvez algo como: já jogou na loteria hoje?, eu já joguei, está acumulado sabia? Não sei, e se Jasmim não gostar de um discurso tão senso comum. Talvez deveria comprar um livro naquele cebo perto da barraca do queijo. Hum, sinto cheiro de defumados. Não devo estar muito longe da barraca de flores. Como será que estou?Bem apresentável?

As andorinhas voltaram, e eu também voltei, consigo ouvir o casal de cegos cantar. Minhas pernas já andam com menos atrito. Preciso andar depressa, Jasmim já deve estar a escolher suas rosas. Mas o que digo a ela? Como iniciar um diálogo. Como fazer com que ela se interesse por mim?

Vou andando pela feira, agora a multidão parece ter ido pra casa. Meu medo aumenta. A cada instante fico angustiado. Acho que fiquei mais inseguro com o esvaziamento da feira. E Agora? Vou poder chegar a barraca de flores, antes tinha uma multidão a me impedir. A partir de agora se não for a barraca serei um verdadeiro covarde. Estou próximo, acho que a estratégia do momento será a do homem seguro. Ando erecto e sério. Algumas pessoas cruzam o meu caminho. Observo um ponto fixo. Elas desviam de mim. Pronto, sou seguro. Uma pessoa séria e prática. Como? Vejo uma mulher e ela nem mesmo dá indícios de que vai se desviar de mim. O que farei? Se eu desviar dela todo esse homem sério e seguro se desmorona ali mesmo. Não posso desviar. Não admito uma mulher sem complexo de inferioridade. Isso é um ultraje! Pronto! Vai bater de cara comigo, não vai desviar. E o pior é que eu ainda preciso ser cavalheiro. É isso! Encontrei a solução! Eu posso desviar por cavalheirismo. E precisa ser agora, antes que me aproxime mais. Se mudar de direção imediatamente vai mostrar que já estava decidido a ceder por cavalheirismo. Assim ainda posso ser um homem decidido. Agora se deixar para desviar quando estiver muito próximo da mulher nós dois entramos em conflito com nossa personalidade. Afinal, eu odeio quando encontro alguém que quando decido mudar de lado ela também decide, ai para não trombarmos decido mudar de lado, só que quando vejo ela também mudou. Odeio esta situação! Então vou disfarçar e olhar as frutas. Pronto! Tudo certo! Meu deus! A barraca de flores está logo ali. E como imaginava Jamim está na décima primeira rosa. Não consigo chegar até lá. O que ela vai achar de mim. Que tipo de homem que compra flores em uma barraca na feira? Um homem apaixonado, um homem muito sensível, ou um homem recém passado por uma tragédia familiar. Eu não posso passar nenhuma destas imagens a ela. O que faço? Já está escolhendo a décima oitava rosa. Preciso pensar rápido.
-Olha o guardanapo.
-Peixe fresquinho.
Ela está na vigésima rosa.
-Olha o sanduíche.
-Pinhão, milho cozido quentinho, pipoca.
Já sei. Mais dois passos chego a barraca de flores. Pronto! Agora não tem mais volta.
- Ei meu chapa! Me vê duas duzias de rosas vermelhas e uma dúzia de rosas brancas. Olá, a senhorita também é vendedora de rosas?
- Não, mas meu marido é! Bem eu já vou indo querido.
- Tudo bem! Deixe que eu fico na barraca. Ah! quantas rosas o senhor queria mesmo?
Minha nossa! Preciso dar um jeito nisso. Já sei.
- Meu telefone está tocando, eu já volto para pegar as rosas...




(Conto Michelle Riemer)